Com a regulamentação do marco legal, UFMG pretende firmar parcerias com o setor privado, arrecadar royalties e comercializar patentes
Por Redação

Liderando o ranking com o maior número de patentes do país, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) agora quer entrar para a história com outro feito: a de detentora da maior quantidade de produtos pensados e desenvolvidos em seus laboratórios, mas que se tornaram realidade no mercado. Para isso se tornar realidade, a instituição vai aproveitar os benefícios da nova legislação tecnológica brasileira, o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei 13.243/16), que agora permite realizar parcerias com o setor privado, arrecadar royalties e, assim, se livrar da atual dependência financeira das agências públicas, atuais responsáveis por bancar a pesquisa no Brasil.
Regulamentado este ano, o decreto do marco legal tem como expectativa de desburocratizar as atividades de pesquisa e inovação no país. Com uma política própria para cuidar do tema, a UFMG espera usar e abusar de seu potencial para comercializar mais de 800 depósitos de patentes.
A regulamentação atual cria mecanismos para integrar instituições científicas e tecnológicas e incentivar investimentos em pesquisa, sobretudo da iniciativa privada. Traduzindo: ideias, conceitos e produção antes submetidos aos entraves burocráticos poderão sair dos laboratórios das instituições como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que deram recentemente e ainda dão vários sinais de crise, para fazer parcerias com empresas dispostas a dar suporte a um setor até então dominado exclusivamente pelas agências públicas de financiamento.
Para a reitora da UFMG, Sandra Goulart, o marco fará diferença na relação das universidades com o setor empresarial no que diz respeito à transmissão de conhecimento. “A UFMG já se destaca, sendo a primeira universidade do Brasil em registro de patentes (são 933). Mas ela também tem que passar o registro para a comercialização. Ou seja, o licenciamento dessas patentes precisa de uma cooperação específica com o setor empresarial”, afirma.
Ela explica que nas universidades brasileiras sempre se fez muitos registros de patentes, mas, devido ao aparato legal que ficou ultrapassado ao longo dos anos, era difícil realizar a transferência tecnológica, o que causava desinteresse do setor empresarial. “Com a mudança do marco, esse arcabouço legal vai permitir que as universidades possam fazer parcerias e que isso seja mais ágil nessa inovação, importantíssima para o país”, diz.
Além disso, a reitora destaca que é preciso quebrar o tabu que existe nas empresas que não procuram as instituições públicas de ensino na proporção que seria ideal. A partir de agora, torna-se objetivo principal aproximar os dois para realizar a pesquisa de ponta. Na UFMG, por exemplo, foram realizados contratos de licenciamento para aproximadamente 100 das 933 patentes. Três se destacam: plataforma de busca Somos, utilizada por outras universidades, como a Unicamp e a UFRJ; vacina contra leishmaniose (Leish-tec); e a mosquitrap, armadilha para capturar as fêmeas do Aedes aegypti.
Mas ainda existe muita pesquisa que precisa ser comercializada. Atualmente, a UFMG tem, aproximadamente, 900 registros que precisam ser comercializados. “É um potencial enorme para o país”, ressalta.
Transferência tecnológica
Para acelerar este processo a UFMG aprovou, em dezembro, sua Política de Inovação, com as diretrizes gerais da universidade para atender várias demandas do marco legal. Ela passou pela aprovação dos conselhos de Ensino, Pesquisa e Extensão e, em seguida, do Universitário. De acordo com a Universidade várias questões foram pensadas para impulsionar essa transferência de conhecimento, entre elas: regras e condições para compartilhamento e uso por terceiros de seus laboratórios e equipamentos, recursos humanos e capital intelectual; possibilidade de participar do capital social de empresas, seja diretamente ou por meio de usufruto de cotas ou ações; e possibilidade de licenciamento de tecnologia para empresas pesquisadores da UFMG são sócios, por exemplo.
Outra mudança foi a saída da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT) da Pró-Reitoria de Pesquisa. Agora, ela está oficialmente ligada ao gabinete da Reitoria e passa a se chamar Núcleo de Inovação Tecnológica e Social (Nits), tendo interação forte junto à Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), com o objetivo de agilizar os processos. Segundo Goulart, com essa mudança agora é permitido a entrada de recurso para a universidade por meio do compartilhamento e uso de sua infraestrutura.
Setor privado pode aliviar a crise
“Trazer o setor empresarial para perto das universidades é uma forma de garantirmos a pesquisa de qualidade com outras verbas que não sejam as governamentais”, afirma Sandra Goulart. O aporte financeiro que virá pela entrada do setor privado traz a expectativa de alívio diante a crise em que algumas agências públicas de financiamento se encontro. Em agosto do ano passado, por exemplo, a pesquisa ficou ameaçada devido ao contingenciamento de verbas do CNPq. Diante dessa situação, o presidente da instituição, Mario Neto Borges, afirmou que só havia dinheiro para pagamento das bolsas até aquele mês. Somente na UFMG, eram 3.469 bolsas.
O orçamento para 2017, aprovado pelo Congresso e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, era suficiente para as despesas do ano, sendo previstos R$ 1,3 bilhão do Legislativo e R$ 400 milhões do fundo. O problema é que 44% desses valores estavam contingenciados.
A reitora resalta que os cortes nas agências são uma preocupação e destaca a posição do Brasil como 13º produtor de artigos científicos e que esse avanço pode ficar vunerável se esses recursos e apoio não forem sustentáveis ao longo dos anos. “O Brasil avançou muito e o marco legal vai dar um passo à frente. Diferentemente de outros países, no Brasil, são das universidades e institutos públicos o papel de fazer pesquisa de ponta. Somos referência para a América Latina e as pessoas não se dão conta disso muitas vezes.”
Fonte: Estado de Minas