Temos um novo modo de aprender e ensinar. A profissão de professor está sendo engolida e o mundo será de quem se preparar melhor
Por Alysson Lisboa/SIMI, De São Paulo
Vanderlei Martinianos: O professor deverá ser o mentor e contribuir para a formação individualizada do aluno. Foto: Caroline Marques/SIMI
No terceiro dia da Campus Party, a tecnologia ligada à educação foi o grande tema. O palco principal (Feel the Future) trouxe dois importantes pesquisadores com percepções muito similares. Na primeira palestra parecia que o convidado tinha saído de uma máquina do futuro diretamente para o palco da Campus Party. Vanderlei Martinianos trabalha com tecnologias educativas na Université de Poitiers, na França, e deixou a plateia atônita quando se referiu à nova escola que já está batendo à porta.
O pesquisador abriu sua fala apresentando a École 42, projeto do qual ele faz parte. Patrocinado pelo bilionário francês Xavier Niel, o projeto gratuito funciona 24 horas por dia, sete dias por semana em Paris. O modelo disruptivo da escola atraiu, já na primeira inscrição, mais de 70 mil pessoas. São centenas de computadores de última geração espalhados pelos três andares do edifício. São mentorias, aulas em vídeo e exercícios online. O projeto é hoje peregrinação de educadores, professores e governantes de todo o mundo. Você pode até acampar na escola, e qualquer semelhança com a Campus Party não é mera coincidência.
Mas o que vai mudar realmente? Tudo! Segundo Martinianos, o ideal é esquecer o modelo atual de educação. “Ainda não chegamos no tempo da escola que vai transformar a humanidade, mas estamos muito próximos. As pessoas não estão dando conta de que isso está tão perto”, profetiza. O palestrante provocou o público sobre a necessidade do diploma. “O que você acha que vai valer mais? Seu conhecimento sobre um determinado assunto ou o diploma que carrega debaixo do braço?
Já imaginou disciplinas como Inteligência artificial, Impressão 3D, Big data, Medicina digital, Biologia sintética? Todo o conhecimento estará disponível na nuvem. As escolas terão que discutir temas que hoje ainda não estão, nem de longe, na pauta. Doping legal, implantes intercerebrais e uma modificação genética massiva. As escolas devem preparar mão de obra para produzir códigos e entendê-los. A geração de jovens que está emergindo é capaz de assumir negócios e gerir empresas. Na escola portuguesa Ponte, outro modelo inovador, quem recepciona os visitantes são crianças. As novas gerações estão ditando as regras e dizendo como querem aprender.
A tecnologia não basta, precisamos entender cada aluno
Bagunceiros, engraçados, sérios, dedicados… Geralmente é assim que podemos classificar os alunos em sala de aula. Não temos pesquisas profundas, laudos ou qualquer outra ferramenta para entender, em detalhes, como realmente é o aluno e qual estímulo temos que dar a ele. Partimos de uma sala pasteurizada e um modelo único de aprendizado. Porém, cada indivíduo constroi uma trajetória particular. A genética pode determinar, por exemplo, quais são as competências mais fáceis de serem trabalhadas e como esse aluno pode absorver o conteúdo. “Precisamos respeitar o estilo de cada estudante”, completa o professor.
Neuroeducação, neurociência, psicologia e pedagogia vão se unir para resolver o problema. Martinianos mostra diversos caminhos e, segundo ele, a ciência é um forte aliado. A escola precisa conhecer seu aluno e como é sua biologia. Exame da íris, Big 5, DNA e Tipo sanguíneo são alguns dos mecanismos disponíveis que podem revelar, em detalhes, informações sobre o indivíduo e, desse modo, particularizar seu aprendizado.
Elementar, meu caro Watson
Além dos canais que disponibilizam cursos como Moocs, Khan Academy, Coursera, Geekie Lab e tantos outros, existem supercomputadores que trabalham com inteligência artificial e produzem resultados extraordinários. O computador IBM Watson já leu todos os artigos científicos de medicina do Wikipédia e pode realizar uma triagem com grande precisão. “O Watson imprime uma análise que um médico demoraria 35 anos para apreender”, completa o pesquisador.
Outra palestra que aconteceu no palco principal foi a do fundador da plataforma Matific, Guy Verdi. Ele utiliza games para ensinar matemática. “Assim como a tecnologia revolucionou outras indústrias, ela vai também revolucionar a educação”, enfatiza. A tecnologia deve ser usada como canal de distribuição. Verdi entende o aprendizado como um processo ativo.
Uma pesquisa realizada no Massachussetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, mostra que a atividade cerebral de um aluno sentado na sala de aula é similar à atividade quando assistimos TV. “Essa é a pior maneira de estimular a mente. As atividades em laboratório ativam muito mais o cérebro”, completa.
Construir e aprender errando
O erro não pode penalizar o aluno, ele faz parte do processo de aprendizado. “Temos que ser tolerantes com as falhas”, afirma Verdi. Outra pesquisa realizada nos EUA mostra que 75% dos alunos entrevistados têm medo de não irem bem na escola. “O que fazemos com o resultado das notas dos alunos? Demoramos um ano para observar e corrigir o problema, temos que ser mais rápidos nisso”, completa.
Verdi tem o mesmo pensamento de Martinianos sobre o futuro do professor. Ele continuará sendo fundamental, mas vai mudar seu papel, será uma espécie de coach na formação integral do aluno.
Foto: Caroline Marques/SIMI
Tecnologia e educação para todos
O pesquisador termina sua palestra com um alerta importante. Se hoje já existe uma diferença entre ricos e pobres, a tecnologia vai aumentar ainda mais essa distância. Precisamos ter certeza de que todo mundo terá acesso à mesma tecnologia, para assim, poder utilizá-la. Isso é importante para o futuro das crianças. Toda a conectividade, novos dispositivos e big data vão melhorar a educação, mas o acesso às tecnologias deve ser universal, caso contrario vamos, no futuro, aumentar a distância entre pobres e ricos.
Precisamos criar escolas abertas, internacionais e bilíngues com uma educação personalizada, reflexiva e escalável. O que você acha que aconteceria com o mundo se retirássemos agora toda a tecnologia empregada nos bancos e na indústria automotiva, por exemplo? Agora, o que aconteceria se retirarmos a tecnologia da sala de aula? Então? Temos um problema grande para resolver, não é verdade?
Confira a cobertura da TV SIMI do 3º dia da Campus:
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